Por Adenildo Bezerra
Volto 37 anos no tempo, guiado pela luz da memória, até a manhã do dia 26 de setembro de 1988, uma segunda-feira que amanheceu envolta em encanto e reverência. Era o dia em que a imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima visitaria Arari. Às 6 horas da manhã, já me encontrava pronto, vestido com a farda icônica do Colégio do Padre: bata branca com bolsos laterais, calça de tergal azul-marinho, meias pretas e, nos pés, as eternas kichutes.
Todos os alunos deveriam estar às 6h30 na Praça da Bandeira, em frente à Igreja Matriz, para receber a santa com louvores, flores e fervor. E lá estávamos, numa cidade interiorana do Maranhão, aguardando uma visita que mudaria para sempre nossa memória coletiva. Arari, pequena e acolhedora, foi escolhida para ser parte da peregrinação da Virgem de Fátima pelo Brasil, e se fez grandiosa nesse dia.
Gente de todas as partes: cidades vizinhas, regiões distantes do Maranhão e até de outros estados lotaram nossas ruas. Era uma multidão que Arari jamais havia visto. A imagem chegou e foi colocada num altar especialmente preparado na praça. Na avenida Dr. João da Silva Lima, enquanto a imagem passava, a emoção se espalhou como perfume no ar. Pessoas acenavam, choravam, rezavam comovidas. O povo saudava Maria com uma fé viva, pulsante, arrebatadora. O céu parecia abençoar cada gesto.
Durante duas horas, o coração da cidade bateu no mesmo compasso: devoção, alegria, esperança. Era como se o tempo tivesse parado para contemplar aquele espetáculo sagrado. A visita de Nossa Senhora de Fátima foi, sem dúvida, o mais expressivo e impactante acontecimento da história de Arari, ao menos do que pude testemunhar. Um momento digno de ser eternizado.
Esse marco de fé também ficou gravado como o coroamento da missão sacerdotal do inesquecível Padre Clodomir Brandt e Silva, que viu seu rebanho florescer em devoção diante da Mãe Celestial.
Ainda naquele mesmo ano, o contraste. Uma tarde escura, carregada de trovões e medo. Uma tempestade assustadora caiu sobre Arari. O vento arrancava telhas como se fossem folhas. Postes vieram ao chão, ruas se transformaram em rios. Eu tinha apenas nove anos e cursava a segunda série. A professora Mary Lopes, de saudosa memória, nos mandou abrigar sob as carteiras. Do lado de fora, o mundo parecia desabar.
Assim foi 1988: ano de extremos, de fé e temor, de luz e trevas. Mas é a visita da imagem de Fátima que ainda resplandece em minha lembrança, como a aurora de um tempo em que o sagrado tocou nosso chão. E que fique registrado aqui, nesta crônica singela, que aquele dia, 26 de setembro, foi, para mim, o maior de todos em nossa querida Arari. Foto: Canção Nova