Procuradora da República Raquel Dogde, pede para o STF não analise ações sobre prisão em 2ª instância

 

BRASÍLIA — Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu que a corte deixe de examinar de uma vez por toda as ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) que tratam do início da execução da pena. Em outras palavras, Dodge quer que o STF extinga o processo e não discuta novamente o tema, mantendo a orientação atual, que permite prisão após condenação em segunda instância.

Caso o STF volte a analisar a questão, ela pede que sejam negados todos os pedidos que podem mudar o entendimento vigente. Isso inclui a liminar solicitada pelo PEN na semana passada para que fiquem suspensas as prisões na segunda instância. O relator, ministro Marco Aurélio Mello, quer levar o caso a julgamento na sessão desta quarta-feira, a despeito da oposição da presidente da corte, Cármen Lúcia.

Raquel Dodge destaca que a questão foi analisada em quatro momentos diferentes desde 2016, sempre no mesmo sentido: pela manutenção da autorização para prender após condenação em segunda instância. Foram três vezes em 2016, e uma na semana passada, durante julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Assim, não é hora de rever posicionamentos recentes da própria corte, mas de respeitar os precedentes. Do contrário, a efetividade do sistema penal (punição dos condenados) e a confiança da população na estabilidade e coerência das decisões do STF estarão sob ameaça.

“Um dos critérios que a presidente (Cármen Lúcia) adota, segundo pronunciamento recente, é o de não pautar temas decididos recentemente pelo Plenário em autos de repercussão geral, a menos que haja fato novo ou situação excepcional que indique a necessidade de reapreciação da matéria. Este critério ampara a estabilidade dos precedentes da Corte e dá oportunidade para exame de outros temas relevantes pelo Plenário, alguns aguardando pauta há vários anos. Este critério racional e coerente realmente justifica que as ADCs ainda não tenham sido pautadas para julgamento de mérito”, escreveu Raquel Dodge.

No pedido, o PEN alegou dois fatos que justificariam a rediscussão da questão: os votos dos ministros Gilmar Mendes e Rosa Weber no habeas corpus de Lula. Gilmar, em 2016, foi a favor da prisão em segunda instância, mas, agora, defende a execução da pena somente após análise pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que funcionaria como terceira instância. Há dois anos, Rosa foi contra prisão em segunda instância, mas, na semana passada, votou contra o pedido da defesa de Lula alegando que respeitaria o entendimento vigente na corte e que um caso específico não poderia ser usado para rediscutir o tema.

Na avaliação de Raquel Dodge, não é possível afirmar como será o voto de Gilmar Mendes e Rosa Weber quando as ADCs, que tratam do tema de forma genérica, forem julgadas em definitivo. Para a procuradora-geral, seria um “indevido exercício de adivinhação”.

“Em nenhuma passagem de seu voto oral ou escrito a Ministra Rosa Weber afirmou que votará pela procedência das ADCs nºs 43 e 44. Logo, não há fato novo”, acrescentou Dodge, dizendo ainda que o PEN “quer extrair do voto da ministra Rosa Weber no julgamento do HC nº 152.752 (Lula), em 04.04.2018, mais do que ela disse”.

A procuradora-geral também destacou o que ela vê como efeitos das decisões de 2016 permitindo a prisão após condenação em segunda instância no combate aos crimes de colarinho branco, como corrupção. Entre 2009 e 2016, prevaleceu o entendimento de que a prisão só era possível após o trânsito em julgado, ou seja, quando esgotados todos os recursos. Na prática, isso fazia com que muitas vezes o STJ e o STF funcionassem respectivamente como terceira e quarta instâncias, retardando o cumprimento da pena.

“Em razão deste precedente, desde 2016 criminosos de ‘colarinho branco’ passaram a ser presos após o encerramento do duplo grau de jurisdição no tribunal de apelação, algo que antes não acontecia basicamente em razão da capacidade financeira desses réus mais afortunados de arcar com a interposição sucessiva de recursos contra as respectivas condenações, protraindo ao máximo no tempo o trânsito em julgado, até o atingimento da prescrição”, escreveu Dodge.

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