O jornal espanhol El País, em sua versão eletrônica para o Brasil, faz uma radiografia dos tribunais de contas do Brasil e conclui que eles deixam passar irregularidades nas suas barbas – irregularidades que foram expostas pela Operação Lava Jato, mas que os conselheiros nada viam. Aliás, quase um quarto dos 233 conselheiros dos tribunais brasileiros também enfrentam processos, alguns estão presos e em comum têm o fato de que foram nomeados por amigos para servir aos mesmos amigos.
Oito em dez dos responsáveis por fiscalizar no Brasil têm elo com políticos, diz Transparência Brasil. No último ano, pelo menos 13 conselheiros foram afastados por suspeitas de corrupção
“As minhas contas foram aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado.” Essa frase está na ponta da língua dos políticos investigados na Operação Lava Jato por fraudar licitações e superfaturar obras. E o argumento não é falso. Os ex-governadores Beto Richa (PSDB), do Paraná, Aécio Neves (PSDB), de Minas Gerais, e Sérgio Cabral (MDB), do Rio de Janeiro, – investigados por suspeita de terem favorecido empresas em licitações –, tiveram as contas aprovadas nos tribunais de contas de seus estados, colocando em xeque a credibilidade dos órgãos de controle como mecanismo para coibir esquemas de corrupção.
O problema é que, entre os julgadores das suas movimentações financeiras, estavam aliados políticos. A ONG Transparência Brasil revelou, em estudo publicado no ano passado, que oito em cada dez conselheiros de contas do país exerceram mandatos eletivos ou altas funções em governos. A pesquisa, realizada em 2014 e atualizada em 2016, incluiu membros do Tribunal de Contas da União (TCU), dos 27 tribunais de contas dos estados e do Distrito Federal, e dos tribunais municipais. Existem quatro tribunais de contas do conjunto de municípios dos estados de Pará, Goiás, Ceará e Bahia, e Tribunais Municipais de contas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.
O levantamento mostra que 23% dos 233 conselheiros e ministros respondem a processos ou já foram punidos na Justiça e até mesmo nos próprios tribunais de contas. Os supostos guardiões do dinheiro público são acusados de fraudar licitações, superfaturar obras e enriquecer ilicitamente. A mais comum acusação que recai sobre eles: improbidade administrativa.
Embora não tenha havido nenhuma investigação específica sobre elas, a Operação Lava Jato escancarou a participação dos integrantes dessas cortes estaduais, municipais e federal nos esquemas de desvio de dinheiro. No Rio de Janeiro, cinco conselheiros do TCE estão afastados, suspeitos de cobrar propina para fazer “vista grossa” de contratos do governo com empreiteiras.
Até fevereiro deste ano, o ex-ministro das cidades do governo de Dilma Rousseff Mário Negromonte (PP-BA) ocupava uma cadeira no conselho do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado Bahia (TCM). Ele foi acusado de pedir propina de R$ 25 milhões para beneficiar empresas do setor de rastreamento de veículos quando era ministro. Indicado pelo ex-governador Jaques Wagner (PT-BA), em 2014, o conselheiro foi afastado depois que virou réu por corrupção passiva. O senador Agripino Maia (DEM-RN) teria influenciado a mudança de parecer do TCE do Rio Grande do Norte, favorecendo a OAS na construção do estádio Arena das Dunas para a Copa do Mundo de 2014, de acordo com denúncia da Procuradoria-Geral da República, acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A operação atingiu também a cúpula do TCU. O filho do ministro Aroldo Cedraz (ex-deputado federal da Bahia pelo PFL, hoje DEM), o advogado Tiago Cedraz, passou a ser investigado em 2015 depois de o dono da empreiteira UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, ter dito que o contratou para obter dados de difícil acesso na corte e para comprar uma decisão referente à usina nuclear Angra 3. Procurados pela reportagem da Pública, todos negam as acusações. (Leia o que dizem os citados) Com informações do contraponto